UESSBA – UNIDADES DE ENSINO SUPERIOR DO SERTÃO DA BAHIA
FACULDADE DO SERTÃO
RELATÓRIO DE PESQUISA DE CAMPO: HISTÓRIA DO BUMBA
Irecê, 2007
Por:
AYRTON CARDOSO VIANA e
MARIA EMILIA DOURADO PIMENTA VIANA
“A invocação do passado constitui uma das estratégias mais comuns nas interpretações do presente.
O que inspira tais apelos não é apenas a divergência quanto ao que ocorreu no passado e o que teria sido esse passado, mas também a incerteza se o passado é de fato passado,
morto e enterrado, ou se persiste, mesmo que talvez sob outras formas”.
Edward Said
JUSTIFICATIVA
Estudar os acontecimentos do passado faz com que os seres humanos se situem
dentro de uma realidade que não foi vivida, mas da interação do indivíduo com esses acontecimentos faz com que se tenha a sensação de se estar vivente esta realidade, no presente.
Na visão de BORGES (1993) ele situa esse conhecimento e essa história como:
“O conhecimento histórico serve para nos fazer entender, junto com outras formas de conhecimento, as condições de nossa realidade, tendo em vista o delineamento de nossa atuação da história (...) de conhecimento histórico cujo objetivo são as transformações permanentes de homens vivendo em sociedade” (p.49).
O presente trabalho de pesquisa junto à comunidade de América Dourada (BA),
estará trazendo uma contribuição para o estudo de histórias que se passaram ou se passam, neste caso específico o “BUMBA”, nesta região como também em outras do estado da Bahia e porque não dizer do imenso Brasil e que, não se sabe por que motivos não são registrados, e os poucos relatos que se tem são aqueles contados por pessoas que viveram essa história, sem, portanto serem catalogadas e registradas. Parafraseando Borges, pode-se dizer que “Cada realidade história é única, não se repetindo nunca de forma igual”.
Portanto quando se faz um levantamento e estudo de acontecimentos, que devido a fatores inerentes ao presente trabalho, não foi devidamente registrado, é de se esperar que outros tomem iniciativas deste tipo para que se possa dentro de uma lógica história, se colocar, não só na memória, mas no cotidiano dos indivíduos que se deva zelar por esse patrimônio que não seja só aqueles relacionados a prédios, igrejas ou monumentos, como também os referentes a cultura do povo, isto porque só se pode conhecer algo do
passado através do que desse ficou registrado e documentado para a posterioridade.
A história do Bumba
Para que se possa dar início ao trabalho proposto, é de praxe verificar o que os PCN’s, falam a respeito do assunto e, sobretudo de estudos que engloba histórias e como elas podem ser influenciadas no quesito relacionado à educação:“Os estudos consideram que no confronto entre povos, grupos e classes, a nas lutas, por momentos de permanência de costumes ou valores, por transformações rápidas e lentas”. (p.31)
Para conhecer a verdadeira história do Bumba (atração folclórica e religiosa) realizada todos os anos, especificamente no dia 18 de janeiro, na cidade de América Dourada, situada à 420 km da capital do estado da Bahia, e como foi relatada por diversos moradores daquela cidade, a chamada festa do Bumba, teve origem quando da comemoração da festa do padroeiro daquela localidade São Sebastião. A festa de São Sebastião é sem dúvida a festa religiosa mais antiga das terras da fazenda Lagoa Grande, adquirida pelo patriarca João José da Silva Dourado. Suas terras correspondem hoje a vários municípios tais como: América Dourada, João Dourado, Irecê, Lapão, São
Gabriel, Ibititá, Presidente Dutra, Jussara e outras localizadas na chamada Micro Região de Irecê. Quando a família Dourado vieram da cidade de Macaúbas por volta do ano de 1870, tomaram posse das terras, se instalaram a princípio em América Dourada e o Sr. Teotônio Marques Dourado e sua esposa Amélia Dourado, pais de Teotônio Marques Dourado Filho “Tiozinho”, trouxeram consigo naquela época a primeira imagem de São Sebastião e logo em seguida construíram a primeira capela de América Dourada, que na época era coberta de palhas de carnaúba.
Com o crescimento do povoado pessoas das comunidades vizinhas passaram a
ser devotos do padroeiro São Sebastião, o qual é festejado dia 20 de janeiro, e o seu novenário é iniciado no dia 11 de janeiro, sendo o dia 18 o mais “popular”, o mais animado e querido do novenário. Em 1898 o senhor Cândido Borges, devoto de São Sebastião e mordomo da noite de 19 de janeiro, oitava noite do novenário, vinha do Tareco acompanhado por sua esposa, povoado da vizinha cidade de Morro do Chapéu, para festejar São Sebastião com a reza e depois sair pelas ruas da cidade, sempre à luz de candeeiros e lanternas, pois na época não existia a luz elétrica. É justamente neste dia
que o Bumba sai pelas ruas da cidade, com o povo acompanhando o tradicional
“Bumba de Cândido Borges”, como é popularmente chamado, cantarolando músicas
e modas do passado, conservando uma tradição que teve início de 1898, com o Sr. Cândido Borges, e seguido por muitos de saudosa memória, a exemplo de: Severiano Rodrigues, Zezinho de Cândia, Aurindo Pereira, José de Andradina, Francisco de Melo “Liobininho”, Zé de Abílio que com a sua sanfona de oito baixos, a famosa “pé-de-bode”, tocou pelas ruas de América Dourado por mais de cinqüenta anos, nas noites de 18 de janeiro, e tantos outros não menos importantes que tiveram presença e participações tão importantes.
A tradição continua viva cada vez mais na memória do povo daquela cidade, à
qual é seguida pelas novas gerações, tendo como principais “mordomos” ou
organizadores do novenário da noite do dia 18, pessoas como: Juarez Antonio de Oliveira “Piauí”, Mauro Henrique “Ito”, Vicente Paulo Dourado, José Marcos “Marquinhos”, José Otaviano “Tivi”, Henrique Dourado Primo “Americano”, Francisco Augusto Dourado “Chico de Henrique”, Sebastião Guedes Davi “Bito”, Sebastião Paulo Dourado “Tião”, Ayrton Cardoso Viana, João Paulo e João Vitor Dourado Viana, e tantos outros.
O dia 18 de janeiro, dia do Bumba, como é mais conhecido, é festejado de zero hora do dia 17 para o dia 18, com sanfoneiros sempre tocando em um local organizado pelos mordomos, e às 03h00minh da manhã todos se encaminham para frente da Igreja, para dar início à alvorada, logo em seguida saem pelas ruas da cidade, tocando e cantando até às 06h00minh da manhã, onde na oportunidade são servidas comidas típicas para todos que “agüentaram” amanhecer o dia. São comidas “pesadas” que servem tanto para curar a ressaca de sono, como o cansaço, tais como: bode cozido, sarapatel, buchada, mocotó e outras iguarias.
Durante todo o dia 18 sempre tem um sanfoneiro em um bar ou lanchonete, de
preferência os mais freqüentados da cidade, tocando e cantando para animar a
turma que até este momento ainda está em pé.
À noite todos vão participar da novena em preparação à festa do padroeiro São Sebastião e, logo em seguida ao final da novena, se reúne em frente à Igreja, usando camisas comemorativas deste dia. Saem pelas ruas da cidade visitando as casas dos mordomos, onde não falta uma bebida para alegrar os tocadores do Bumba e as pessoas, sempre acompanhados pela sanfona “pé-de-bode”, pífano, flauta, tambor (bumbo) triangulo e pandeiro, atualmente são acompanhados apenas pela sanfona, bumbo e triângulo, e vão até às 12:00h. Esta multidão de gente sabe na ponta da língua todas as músicas e modas do passado que são cantadas durante o percurso da festa,
músicas como: Lero-Lero, Brejão da Gruta, Valdete, Adeus Jacobina, Você pensa que cachaça é água, Jardineira, Santos Reis, Coqueiro da Bahia, Eu vou plantar cacau e de quando em vez soltam o seu grito de guerra “Viva o dia 18”.
CONCLUSÃO
Pode-se dizer que um povo sem história é um povo sem memória, e um povo que
não registra a sua história não tem um passado ao qual possa de deliciar no presente, ou como escreve BORGES (1993) “Mas a história também é aceita como o estudo do passado, em função de um presente, desde a história dos gregos” (p.56), dito isto se percebe que, a escrita da história é a escrita do próprio sujeito, enquanto pessoa responsável pela grande história de viva de se avizinha.
Não é possível afirmar que as fontes ou documentos são um espelho fiel da
realidade, mas são sempre a representação de parte ou momentos particulares do objeto em questão. O mesmo BORGES (1993) afirma “Uma fonte representa muitas vezes um testemunho, a fala de um agente, de um sujeito histórico, devem ser sempre analisados como tal” (p.61).
A preocupação com a preservação da memória histórica cultural é fenômeno
que vem caracterizando, desde o final do século passado e início desce milênio, por um número considerável de instituições em âmbito nacional, principalmente por instituições públicas e privadas, como também por organizações não governamentais, segmentos sociais os mais diversos, pena que esta região ainda se encontra aquém das expectativas nacionais relacionadas à formação e escrita de sua própria história, apesar de se ter
pessoas com capacidade para tal fim.
Nos PCN”s diz-se que “A comunicação entre os homens, além de escrita, é
oral, gestual, figurada, musical e rítmica” (p.30) e partindo desse pondo aqui vai os agradecimentos às pessoas de Vicente Paulo Dourado, Henrique Dourado Primo, Mário Henrique, Jardilina Rodrigues Lima, Maria das Graças Dourado Pimenta e Cicera, que muito ajudaram através de depoimentos, fotos e relatos inerentes ao presente trabalho.
E por fim dizer que “escrever história não é estabelecer certezas, mas é reduzir o campo das incertezas, é estabelecer um feixe de probabilidades” (Borges, 1993, p.69).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
BITTENCOURT, Circe. (org.) O saber histórico na sala de aula. 10. ed. São
Paulo: Contexto; 2005. – (Repensando o Ensino)
BORGES, Vavy Pacheco. O que é história. 2. ed. rev. São Paulo: Brasiliense,
2007. (Coleção primeiro passos; 17)
Parâmetros Curriculares Nacionais: História e Geografia/ Ministério da
educação. Secretaria da Educação Fundamental. 3.ed. Brasília: A Secretaria,
2001.
domingo, 9 de setembro de 2007
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Um comentário:
Sena tornei-me sua seguidora no blog, parabéns pelo belo trabalho a cerca do Bumba, não tive tempo de ver todos os artigos, mas creio sê-los muito bons.
Postar um comentário